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sexta-feira, 29 de julho de 2011

PRINÍPIOS ÉTICOS QUE REGEM A AVALIAÇÃO E INTERVENÇÃO PSICOLÓGCA


1. Introdução
A avaliação psicológica constitui uma função privativa do psicólogo. Ela permite a descrição sistemática da realidade psicológica de um indivíduo ou grupo de indivíduos e fornece ao psicólogo um conjunto de informações que serão úiteis para orientar suas acções e decisões futuras, as quais este deve saber interpretar, seleccionar e sobretudo transmitir e devolver. Isto acresce ao profissional de psicologia uma responsabilidade inerente ao cumprimento efectivo dos princípios éticos constantes no Código de Ética Profissional, convista a salvaguardar as variáveis psico-sociais, histórico-culturais e económicas que lhe são intrínsecas enquanto membro da Sociedade. Ser ético, na perspectiva de Aristóteles, é muito mais que uma questão de costumes e de normas práticas. Supõe uma boa conduta das acções, a felicidade pela acção realizada e a alegria da auto-aprovação diante do bem feito em todas as práticas profissionais.
Este singelo artigo tem como objectivo discutir os princípios éticos básicos que devem ser usados pelos psicólogos desde o planeamento do processo de avaliação até a interveção psicológica, de modo a despertar atenção à esse profissional a necessidade de pautar por boas práticas ético-deontológicas nas suas actividades profissionais...

2. Conceitos-chave
Avaliação Psicológica: é um procedimento de análise que visa compreender, esclarecer a dinâmica dos processos psicológicos representativos de um indivíduo; ou seja, refere-se à recolha e interpretação de informações psicológicas, resultantes de um conjunto de procedimentos confiáveis que permitam ao psicólogo orientar suas acções e decisões futuras sobre um determinado comportamento (Instituto Superior Monitor - ISM, 2010).
Intervenção Psicológica: refere-se à toda tentativa de influenciar de maneira transitória ou definitiva o comportamento humano através do uso de meios psicológicos - ou seja, influênciar através de novas formas de comportamento e de experimentar o mundo (Sánchez, 2005 citado pelo Instituto Superior Monitor - ISM, 2010).
Ética: é um ramo da filosofia que procura estudar e indicar o melhor modo de viver no cotidiano e na sociedade, buscando fundamentar o bom modo de viver pelo pensamento humano. A ética profissional é por sua vez o conjunto de normas morais pelas quais o indivíduo deve orientar seu comportamento no exercício da sua profissão (Nazaré at. al., 2010).

3. Princípios éticos na prática da Psicologia segundo a Federação Europeia de Associações de Psicólogos – FEAP
De acordo com a Federação Europeia de Associações de Psicólogos – FEAP (1995), os psicólogos desenvolvem um corpo de conhecimento válido e fidedigno baseado em investigação e usam esse conhecimento em processos psicológicos e comportamentos humanos numa variedade de contextos. Fazendo isto, eles desempenham muitas funções em áreas como investigação, educação, saúde, organizações, consultorias e outras áreas. Segundo a Federação Europeia, os psicolólogos devem, no exercício da sua profissão, se orientar nos seguintes pricípios éticos:

3.1. Respeito pelos Direitos e a dignidade humana: os psicólogos devem conceder respeito apropriado e promover o desenvolvimento de direitos fundamentais, dignidade e valor de toda a gente. Eles devem respeitar os direitos das pessoas à sua privacidade, confidencialidade, auto-determinação e autonomia, consistente com outras obrigações profissionais do psicólogo e com a lei.



3.2. Competência Profissional: os psicólogos devem se esforçar em garantir e manter níveis altos de competência no seu trabalho. Reconhecem os limites das suas próprias competências e as limitações do seu conhecimento. Eles devem oferecer somente aqueles serviços para os quais estão qualificados por educação, treino e experiência. Devem reconhecer os limites das técnicas e procedimentos que for adoptar ao longo do seu trabalho, utilizando-os adequadamente e devem possuir um bom conhecimento dos aspectos éticos - códigos e directrizes - bem como saber integrar esses conhecimentos éticos na prática profissional. Portanto, a competência profissional requer como primeiro requisito a conduta ética, uma vez que não se pode ser ético sem se ser competente

2.3. Responsabilidade: os psicólogos devem estar conscientes das suas responsabilidades profissionais e científicas perante os seus clientes/pacientes, a comunidade e a sociedade onde eles trabalham e vivem. Devem evitar causar danos, ser responsáveis pelas suas acções e garantirem a eles próprios, quando possível, que os seus serviços não estão a ser usados indevidamente.

2.4. Integridade: os psicólogos devem procurar promover integridade na ciência, ensino e prática da psicologia. Nestas actividades, os psicólogos devem ser honestos, razoáveis e respeitosos para com os outros. Devem tentar clarificar, para com os outros grupos relevantes, as acções que estão a fazer e a trabalhar apropriadamente de acordo com essas acções.

3. Pricípios éticos usados na prática da Psicologia, de acordo com o Instituto Superior Monitor - ISM (2010)
3.1. Autonomia: a autonomia diz respeito a capacidade que a pessoa tem de tomar decisões. Neste sentido, o Psicólogo deve informar o paciente acerca do diagnóstico, do prognóstico e das alternativas referentes ao tratamento. Uma vez informado o paciente, corresponde a ele, de acordo com esse princípio, tomar decisões ou escolher alternativa elegida por si para o seu tratamento. Esta capacidade que o paciente tem de escolher a melhor alternativa para o seu tratamento chama-se consentimento informado.
3.2. Beneficência: a benificiência refere-se a obrigação moral de actuar em benefício dos demais. A befeficíência pretende tomar em conta a autonomia do paciente, o respeito pelo paciente e da sua decisão. Neste sentido, o profissional não deve impor o tratamento e o que bem entender sem ter em conta o consentimento do paciente. Todo o exercício profissional do psicólogo tem em contar o benefício claro e inequívo dirigido ao paciente.
3.3. Justiça: a justiça diz respeito ao grupo de normas que garante a distribuição justa de benefícios. O princípio de justiça deve ser um imperativo ético para o profissional, uma vez que ele no exercício das suas actividades procurará tratar todos os pacientes com igual consideração e respeito, sem nunca privar a uns de oportunidades de recuperar a saúde que outros têm disponível.
3.4. Maleficência: diz respeito a capacidade que um profissional de psicologia tem de evitar causar danos e prejuízos ao paciente. Toda a malícia e intencionalidade de causar danos ao paciente deve ser evitada a todos os níveis. O profissional deve agir com rigor, no entanto, no cumprimento da obrigação, regras ou deveres a ponderação deve-se fazer presente, o profissional deve agir tendo em conta o código de ética.
4. Princípios éticos que regem a Avaliação Psicológica segundo o 8° Plenário do Conselho Federal de Psicologia (2007)
No exercício das suas actividades, segundo o VIII Plenário do Conselho Federal de Psicologia (2007), é necessário que os psicólogos se mantenham atentos aos seguintes princípios éticos:
  • Contínuo aprimoramento profissional visando ao domínio dos instrumentos de Avaliação Psicológica;
  • Utilização, no contexto profissional – organizações, educação e saúde - apenas dos testes psicológicos com parecer favorável da Associação de Psicólogos, caso exista, sob observância do Código de Ética de Psicólogos (CEP);
  • Emprego de instrumentos de Avaliação Psicológica para os quais o profissional está qualificado;
  • Realização da Avaliação Psicológica em condições ambientais adequadas, de modo a assegurar a qualidade e o sigilo das informações obtidas;
  • Conservação dos documentos de Avaliação Psicológica em arquivos seguros e de acesso controlado;
  • Disponibilização das informações da Avaliação Psicológica apenas àqueles com o direito de conhecê-las;
  • Proteção da integridade dos testes, não os comercializando, publicando ou ensinando àqueles que não são psicólogos.

Segundo a APA (2002) citada pelo Instituto Superior Monitor – ISM (2005), na avaliação psicológica, os psicólogos devem basear as opiniões contidas nas suas recomendações, informes e diagnósticos ou declarações avaliativas, incluindo testemunhos forenses, em dados e técnicas suficientes para justificar as suas conclusões. Por outro lado, os psicólogos só devem emitir opiniões sobre as características psicológicas dos indivíduos depois de ter efectuado um exame adequado sobre as mesmas  para que sirvam de base das suas declarações ou conclusões.

5. Principios deontológicos na prática da Avaliação e Intervenção Psicológica, de acordo com o Instituto Superior Monitor - ISM (2010)
5.1. Respeito pela intimidade e confidencialidade
O psicólogo deve respesitar o sigilo profissional, o limite do acesso a outros a certos aspectos ligados a pessoa, bem como o conceito de confidencialidade, que diz respeito ao direito que o paciente tem em relação a qualquer informação confiada ao profissional e que a mesma não seja revelada a outras pessoas ou a terceiros sem o consentimento do mesmo.
5.2. Uso da ética: o psicólogo deve administrar, adaptar, corrigir, interpretar ou utilizar técnicas e instrumentos de avaliação, em termos linguísticos e culturais, seguindo um procedimento e para um propósito que seja apropriado à luz da investigação.
5.3. Consentimento informado: os psicólogos devem obter o consentimento informado para a avaliação ou intervenção, a avaliação será realizada por leis governamentais. Se o cliente não autorizar, o psicólogo só poderá proporcionar os resultados do processo unicamente quando forem requeridos pelo código de ética.
5.4. Competência profissional sub o ponto de vista ético: um psicólogo competente necessita, em primeiro lugar, de uma formação adequada e actualizada quer em aspectos científicos, técnicos, como legais e éticos. Por outro lado, um psicólogo competente deve reconhecer os seus limites e trabalhar somente naquilo em que foi formado e treinado adequadamente.  Portanto, a competência profissional é requerida como primeiro requisito na conduta ética.


6. Reflexão
Um profissional competente, na perspectiva do grupo, deve possuir uma formação adequada sobre os aspectos científicos e técnicos dos procedimentos profissionais adotados no exercício da sua profissão. Para um psicólogo, possuir habilidades e conhecimentos de modo a aplicar com sucesso as técnicas, métodos e intrumentos da avaliação e intervenção psicológicas é importante, porém é igualmente importante que o profissional de psicologia espelhe as suas actividades nos princípios éticos plasmados no Códogo de Ética profissional que regem o processo de avaliação e intervenção psicológicas. Mas também é importante que o psicólogo reconheça as suas limitações, fraquezas e os limites das técnicas, métodos e instrumentos que ele usa para a avaliação psicológica, convista a tornar fidedignos os resultados obtidos.
Após uma avaliação ou intervenção psicológicas, na elaboração do relatório final, salienta-se que o psicólogo baseie suas informações na observância dos dispositivos de ética profissional de psicólogos, devendo observar alguns cuidados em relação aos deveres do psicólogo nas suas relações com o cliente/paciente, ao sigilo profissional, as relações com a justiça e ao acesso das informações, identificando riscos e compromissos em relação à utilização das informações presentes nos documentos em sua dimensão de relações de poder.
No processo de avaliação e intervenção psicológica, o profissional tem o dever de guardar sigilo pela confidência recebida. Pois a privacidade e a confidencialidade são características essenciais da relação psicólogo-cliente. Entretanto, existem, nos códigos de ética profissional, condições de ruptura da confidencialidade e o consentimento informado expresso do paciente. Deste modo, o profissional deve estar ciente que qualquer dano causado durante o processo de avaliação e intervenção psicológicas é da sua responsabilidade. O psicólogo não deve colocar os interesses pessoais, do seu grupo profissional e dos seus membros em primeiro lugar em detrimento dos interesses da sociedade e do público em geral, acima de tudo, excepto em situações em que o código de ética profissional assim o recomenda.

7. Conclusão
O trabalho do psicólogo envolve a possibilidade de influenciar profundamente os outros, quer no sentido positivo quer no negativo, o que constitui uma grande responsabilidade social para o profissional de psicologia. O carácter profundamente humano e social do seu trabalho exige, assim, uma consciência das questões éticas que possam surgir no exercício da sua actividade profissional. Para um psicólogo resolver uma questão ou “dilema” ético necessita de reflectir e muitas vezes dialogar com clientes/pacientes e colegas, julgando os diferentes princípios éticos. Nestes casos é necessário tomar decisões e criar alternativas de solução mesmo se ainda existirem assuntos conflituosos. Vale ressaltar que um psicólogo competente deve reconhecer os seus limites e trabalhar somente naquilo em que foi formado e treinado adequadamente. Deve ter um bom conhecimento dos aspectos éticos - códigos e directrizes - bem como saber integrar esses conhecimentos éticos na prática profissional. Portanto, a competência profissional requer, como primeiro requisito, a conduta ética, uma vez que não se pode ser competente sem se ser ético. Contudo, depois da elaboração do presente trabalho concluiu-se que a avaliação psicológica deve levar a dois tipos de garantias: cinetífica e ética. A primeira é ditada pelas organizações científicas e que tratam de regular e garantir os aspectos técnicos de um determinado produto científico; a segunda são as que regulam o comportamento profissional e aparecem como uma forma de auto-controlo das associações profissionais.


8. Referêncais Bibliográficas
Conselho Federal de Psicologia - 8º Plenário (CFP). (2007): Cartilha sobre a Avaliação Psicológica. Brasília Rádio Center. Disponível em: (www.pol.org.br).
Federação Europeia de Associações de Psicólogos (FEAP). (1995). Código de Ética para Psicólogos de acordo com a FEAP: Código Geral de Ética. Atenas. Disponível em: (http://www.psicologia.com.pt/profissional/etica/doc/Codigo_FEAP.pdf, acessado em 04/03/11).

Instituto Superior Monitor (ISM). (2010). Ética e Deontologia Profissional Unidade IV: Introdução à Deontologia Profissional para Psicólogos. Maputo. Disponível em: (http://www.monitor.co.mz/Unidades/Unidades/Psicologia%20PDF/Etica%20unidade%204-PSICOLOGIA.pdf, acessado em 04/03/11).

Nazaré, B. At. al. (2010). Avaliação e intervenção psicológica na perda gestacional. SP





sexta-feira, 10 de junho de 2011

PSICOLOGIA: PERSPECTIVA EUROCÊNTRICA E AFROCÊNTRICA

1. Introdução

Há anos que os fenómenos existenciais da humanidade, incluindo os fenomenos psicológicos, em África são interpretados com base na psicologia ocidental, com métodos, técnicas e intrumentos cientificamante estabelecidos no ocidente. Não obstante, esta psicologia, durante muito tempo, tem-se mostrado, em algumas situações, ineficaz em resolver satisfactoriamente os problemas psicológicos africanos devido, não só às diferenças culturais e entre o ocidente e a áfrica, como também devido às leis humanas que regem o povo africano, que para eles o ser humano, na sua essência, vai além do biológico, do psicológico e do social, atingindo, deste modo o intangível e as suas respectivas relações com o universo. Deste modo, o pensamento ocidental sempre procurou manipular a identidade africana, colocando sempre o africano como um ser não pensante, alegando que o africano era primitivo, supersticioso, não civilizado, sem história e sem cultura. Este artigo tem como objectivo analisar e descrever as diferenças culturais entre os acidentais e os africanos, enfatizando a necessidade de contextualizar à realidade africana, a psicologia ocidental no diz respeito aos seus instrumentos e técnicas. Para a sua elaboração recorreu-se à revisão bibliográfica a partir de livros e artigos científicos que constituem estudos recentes sobre o assunto.




2. Psicologia contemporânea

A Psicologia contemporânea teve suas origens no ocidente e é vista como universal, na medida em que ela tem sido aplicada para sustentar e explicar todos os fenómenos psicológicos (Shweder e Bourne, 1991:114) citado por Holdstock (2000). Segundo Howitt e Owusu-Bempah, (1994) citado por Holdstock (2000), apesar dos apelos para o desenvolvimento da psicologia, a atenção dedicada à psicologia africana tem sido mínima. Com efeito, a psicologia ocidental atribui pouco valor às experiências do povo africano. O mais lamentável é o facto de que a história da psicologia universalista ou eurocêntrica, não é feliz para os africanos que tradicionalmente actua mais como um instrumento de dominação.

Tal como a Psicologia ocidental, a perspectiva africana deve abordar sobre a aquisição da linguagem, da cultura, saúde mental, o comportamento humano, o conhecimento, a atitude de se relacionar com o outro. A centralidade da comunidade, o respeito pela tradiçaõ, alto nível de espiritualidade e envolvimento ético, harmonia com a natureza, natureza social da identidade individual, a veneração dos ancestrais e a unidade do ser, são valores que devem ser considerados integrados nas anamneses psicológicas, nos psicodiagnósticos e na avaliação e intervenção psicológicas (Barros, 2011).

A sociedade africana e a sua cultura, no processo de escravidão, caracterizado pela privação da liberdade e pelo encerramento da mente africana, foi-lhes introduzidos conceitos, ideias, valores, pensamentos e teorias ocidentais como sendo universais capazes de interpretar, intervir e solucionar todos os problemas da humanidade, definindo os africanos em posição intelectual e étnico baixos. Mas é importante se enfatizar que os africanos têm a sua lógica de pensar, sua própria língua e sua própria cultura que devem ser tidas em conta ao interpretar e intervir nos fenómenos psicológicos africanos (Barros, 2011).


3. Interpretação dos fenómenos psicológicos
Os indivíduos possuem dentro de si, vastos recursos para auto-concepção, auto-entendimento, auto-compreensão e para a modificação dos seus auto-conceitos, suas atitudes e dos seus comportamentos. Desde décadas passadas, autores como Asante e Kemet, já falavam da afrocentricidade no sentido de que os africanos precisavam adoptar uma postura de auto-consciência e auto-definição, procurando encontrar dentro de si a sua própria cultura africana e a explicação para todos os fenómenos da humanidade, precisamente os fenómenos psicológicos (Mazama, 2009 citado por Barros, 2011).

No apontamento de Nobles (2009) citado por Barros (2011), refere que quando se explana a respeito da psiquê africana, logo tende-se a procurar explicações nas abordagens psicológicas ocidentais, o que leva a se cometer erros de interpretações a respeito da cosmovisão africana, ou seja, a forma como os africanos vêm o mundo. Neste sentido, a perspectiva africana não vem no sentido de descartar ou negar completamente a perspectiva ocidental, mas sim está contra o princípio negativo causado pela supremacia ocidental nas suas relações de poder e violência, dentre elas a escravidão imposta por eles à milhares de africanos durante centenas de anos, que muitas vezes levou à alienação, aprisionamento psicológico e mortes de milhões de africanos.

Para se entender melhor a dinâmica de funcionamento e os elementos constituintes da mente africana, precisa-se ter em conta, primeiramente, a compreensão da visão que os africanos têm do mundo e os seus significados e soignificantes, pois é o elemento base do entendimento da concepção do que é ser, humano ou pessoa, na perspectiva africana (Nobles, 2009 citado por Barros, 2011). Neste caso, é importante que a África e os fenómenos africanos sejam examinados e apreendidos no contexto africano, ou seja, com significados, ideias e aplicações africanas. Agir de outra forma, que não se adequa ao contexto africano, significa dar primazia às abordagens ocidentais, restringindo a forma de interpretar e intervir nos fenómnos africanos e anular o conhecimento do povo africano. Contudo, é inevitável o uso da psicologia ocidental, na medida em que ela fornece métodos e técnicas cientificamente consagrados para a interpretação e intervenção dos fenómenos psicológicos, independemente da sau origem, sendo apenas importante a sua contextualização.


4. Identidade
Os conhecimentos originários das culturas africanas para a concepção da existência humana ajudam na construção e entendimento da identidade africana, pois além de buscar uma compreensão holística do ser humano, a Psicologia deve dialogar com outros campos do saber, considerando a cultura de cada sociedade (Barros, 2011).
Quando se procura uma abordagem africana para estudar a mente africana, na visão de Barros (2011), deve-se sobretudo, buscar conhecimentos, valores e ideais centrados na cosmovisão africana. Todos os rituais, danças, cânticos, mitos, rezas, fazem parte da identidade africana, pois perpassa pelo processo de auto-realização de cada pessoa e, nessa busca interior, espera-se que cada sujeito possa entender, interrogar e explicar o significado, a natureza e o funcionamento do ser humano, a partir de caminho para a busca da identidade, autenticidade e africanidade.

Ao buscar o sentido da vida, as sociedades africanas realizam rituais que exigem disposições e atitudes das pessoas de fé, que fazem com que elas assumam nas suas vidas aquilo que elas acreditam. Nesses rituais as comunidades executam danças, proferindo cânticos, a partir dos quais o indivíduo entra em contacto com os seus ancestrais e coloca-se fim de todos os males que apoquentam o indivíduo (Honwana, 2002). Comparativamente à cultura ocidental, essa forma típica dos africanos de entrarem em contacto com os antepassados para obter um bem-estar físico, mental, social e espiritual, sob mediação de um curandeiro, corresponde à uma psicoterapia. Deste modo, seria importante conciliar a picoterapia ocidental com as práticas terapêuticas africanas, sem, no entanto, dar primazia à nenhuma delas.

Olhando para o contexto africano actual, fica evidente que o povo africano actual é diferente do povo africano do passado. Durante o processo de colonização, o povo africano sofreu uma “lavagem cerebral”, isto é, foi obrigado a adptar conceitos, valores, crenças, costumes e hábitos culturais ocidentais, que a partir do qual perdeu a sua real identidade cultural, social, política e económica. Ao ser impostos a adptar as práticas culturais ocidentais, o povo africano perdeu a capacidade de se colocar em pé de igualdade e competir com os outros. Com o advento da globalização, que resultou na fusão de culturas, conhecimentos, economia, política, arte, através dos mídia, o povo africano (nós), tendem a perder cada vez mais a sua identidade, passando maioritariamente a se identificar como o outro. Apesar de a globalização ter seus aspectos positivos, como expansão do conhecimento científico, desenvolvimento económico, troca de experiência e intercâmbio cultural, ela põe em causa as manifestações culturais de alguns países da periferia, particularmente os países africanos.    


5. Conceito de pessoa
Por um lado, Ribeiro (1996) citado por Barros (2011), refere que nas sociedades africanas a pessoa é tida como resultante da articulação de elementos estritamente individuais herdados e simbólicos. Os elementos herdados situam a pessoa na linhagem familiar enquanto que os simbólicos a posicionam no ambiente cósmico e social. Para Opoku citado por Nobles (2009) in Barros (2011), a pessoa é vista como um ser constituido por espírito e corpo. Por outro lado, na perspectiva ocidental, a pessoa é vista como um organismo humano completo e em pleno funcionamento, um indivíduo que é capaz de interagir consigo próprio, com o seu meio e com os outros, isto é, a pessoa é vista apenas sob ponto de vista biológico, psicológico e social..
Pode-se observar que a perspectiva africana aborda tanto os aspectos subjectivos da pessoa, quanto os aspectos materiais (físicos) e imateriais (psíquicos), ou seja, esta perspectiva vai para além do físico, na medida em que pessoa é aquela que é capaz de se relacionar não só consigo próprio, com o seu meio e com os outros, mas também com a natureza, com as plantas, com os animais, com os espíritos, com os deuses e com o universo.

Nas culturas africanas, a pessoa está em contacto com os poderes espirituais e é através da prática dessa espiritualidade, que os africanos acessam as suas divindades (conjunto de mitos, ritos e simbolismos), o Deus supremo (dono do ceu) e ao sagrado, e encontram nas suas práticas de espiritualidade e rituais uma linguamgem que vai além da consciência e da psíque humana, eles entram em contacto com a energia organísmica do próprio indivíduo protegendo-o dos seus efeitos auto-destruitivos. Essas práticas estabelecem nos indivíduos ou nas comunidades um sentido para a vida, isto é, um resgate a esse ser humano ecológico e ético (Barros, 2011). Esta visão que o africano tem em relação a pessoa que transcende a dimensão biológica, psicológica e social, parece-nos mais completa e complexa que requer uma atenção especial da parte dos ocidentais e da psicologia contemporânea..


6. Concepção da religião e da divindade
Não sendo necessariamente no sentido de participação de igreja ou aderência a um dogma religioso, os africanos são religiosos no sentido de honrar o que representa uma preocupação da humanidade. Para os africanos o pensamento sobre Deus é expresso através de nomes, tendo em consideração categorias gerais como a natureza de Deus, a relação com Deus, as imagens de Deus e o que Deus faz. Esta visão que os africanos têm sobre Deus é diferente da forma como os europeus usam as suas habilidades científicas para dominar todos os problemas, a natureza e o universo. Contudo, falta à ciência ocidental a capacidade para compreender a realidade africana pois ela restringe-se no observável e no racional (Mbiti citado por Holdstock, 2000). 
 
Parrinder (1969) citado por Holdstock (2000), referindo-se à psicologia africana, defende que o Homem não é só um indivíduo ou somente um ser social, mas ele é uma força vital que continua em contacto com outras forças do universo. Neste sentido, ele as influencia e também é influenciado constantemente por elas e, deste modo, essa força vital está dentro de todos os homens e criaturas formando um laço entre eles.


7. Conclusão
Os europeus desenvolveram uma consciência de superioridade e a ideia de que persuade o mundo pela sua cultura. A construção desta identidade que se afirma superior a todas as outras culturas, resultou da distorção da sua própria história. Esta distorção tem implicações psico-sociológicas, tornando-se produtora de um racismo endémico, ao manter-se confortavelmente apoiada na crença de que a herança helénica predispôs a Europa e o mundo ocidental para avançar pelo racionalismo, enquanto que o mundo africano se mantiveram ligados à metafísica arcáica.
Mas entre as duas perspectivas da psicologia (ocidental e africana), está evidente que a psicologia ocidental com seus métodos, técnicas e instrumentos é incapaz de interpretar, avaliar e intervir eficazmente nos fenómenos psicológicos africanos, visto que a realidade africana é  completamente diferente e distante do contexto ocidental. O homem africano é essencialmente colectivista, espiritual e religioso, não sendo necessariamente no acto de frequentar uma igreja ou um dogma religioso, eles o são no sentido de honrar o que representa uma preocupação da humanidade.
Esse pensamento não ignora a tamanha importância da psicologia ocidental, mas sim não tomá-la como a única perspectiva possível de interpretar de forma válida os fenómenos psicológicos, muito em particular quando se trata de fenómenos psicológicos africanos. Sugere-se que se tenha em conta a cutura do indivíduo em qualquer processo de avaliação e intervenção psicológica, pois, é com base nas crenças e na tradição que este interpreta o mundo. Assim sendo, todas práticas de psicologia ocidental quando usadas em culturas africanas devem ser contextualizadas no sentido de adequá-las à realidade do povo africano.



8. Referências Bibliográficas

Barros, S. da L. (2011). O olhar de uma abordagem afrocêntrica: foco no funcionamento da psiquê africana. Revista África e Africanidades - n. 13, ISSN 1983-2354. Disponível em: www.africaeafricanidades.com, acessado aos 02.06.2011, 13hrs31min

Holdstock, T. L. (2000). Re-examining Psychology - Critical perspectives and African insights. Canada: Routledge.

Honwana, A. (2002). Espíritos Vivos, Tradições Modernas: possessão de Espíritos e Reintegração social Pós-guerra no sul de Moçambique. Edições Promédia.




quinta-feira, 26 de maio de 2011

GESTÃO DE CONFLITOS E AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NAS ORGANIZAÇÕES

1. Introdução

A avaliação de desempenho é uma das principais tarefas do Gestor de Recursos Humanos, já que  é um dos instrumentos essenciais para a manutenção e a melhoria da qualidade do serviço, do produto  e da produtividade na organização. Como um processo que visa a apreciação sistemática de um colaborador segundo um trabalho feito, suas aptidões e outras qualidades necessárias à boa execução do seu trabalho, a avaliação de desempenho permite identificar problemas de supervisão e de gestão, de integração das pessoas à organização, de adequação da pessoa ao cargo e de localização de possíveis dissonâncias ou carências de treinamento. Esse processo deve, pois, ser implementado de modo sistêmico e sistemático, abrangendo à todos os níveis da organização e deve ser um processo participativo, dinâmico e sujeito a constantes revisões.
Durante o processo de avaliação podem surgir conflitos - processo que se inicia quando um indivíduo ou grupo de indivíduos se sente negativamente afectado por uma outra pessoa ou grupo de pessoas - resultantes da subjectividade da avaliação e das discórdias entre os colaboradores e o gestor. Contudo, este artigo tem como objectivo discutir até que ponto o processo de avaliação de desempenho pode gerar conflitos nas organizações e como gerí-los. Para a sua elaboração efectuou-se uma revisão bibliográfica – livros e artigos científicos constantes na internet -, a partir da qual se fez uma reflexão analítica sobre o tema.
2. Avaliação de desempenho nas organizações
As organizações esperam resultados das pessoas que nelas trabalham. As pessoas devem ser produtivas, o trabalho deve ser executado com qualidade e sem desperdício e os objectivos da organização devem ser efectivamente atingidos. Além disso, os colaboradores também devem proporcionar inovações nos processos de trabalho, usando todo o seu potencial para tornar a organização cada vez melhor. Nesse âmbito, surge a avaliação de desempenho, processo que consiste na definição dos resultados esperados com base no planeamento estratégico da organização, no acompanhamento do progresso dos trabalhos, na solução contínua dos problemas ocorridos e na verificação final dos resultados conquistados para a elaboração das propostas futuras.

 De acordo com Ferreira & Lopes (2007) , avaliação de desempenho é a apreciação sistemática de um colaborador segundo um trabalho feito, suas aptidões e outras qualidades necessárias à boa execução do seu trabalho. Ela está ligada, frequentemente, mas não necessariamente, as vantagens financeiras a titulo de encorajamento. Este processo, na visão de Reifschneider (2008), requer que os colaboradores participem da elaboração de indicadores e da colecta de dados que demonstrem o seu desempenho. Para Chiavenato (1981) citado por Ferreira & Lopes (2007), a avaliação de desempenho é uma apreciação sistemática de desempenho do indivíduo no cargo que ocupa e do seu potencial de desenvolvimento.
2.1. Objectivos da avaliação de desempenho
A avaliação de desempenho tem como principal objectivo analisar o desenvolimento dos funcionários, promovendo um melhor crescimento pessoal e profissional. É um instrumento que visa medir a competência do funcionário no exercício do cargo ou na tarefa efectuada, durante certo período de tempo. Com a avaliação de desempenho a organização poderá colectar dados e informações sobre a performance de seus funcionários e direccionar suas acções e políticas no sentido de melhorar o desempenho organizacional, por intermédio de programas de melhoria do desempenho dos funcionários (Nascimento, Lopes & Argimon, 2005).
Segundo o Grupo de Gestão de Desempenho Funcional - GGDF (2003), a avaliação de desempenho tem os seguintes objectivos:
·        auxiliar no processo de definição dos resultados esperados dos colaboradores e no planeamento das actividades para o seu alcance;
·        aumentar o comprometimento dos colaboradores para o alcance dos resultados desejados pela organização;
·        melhorar a comunicação entre os níveis hierárquicos na organização, proporcionando uma troca de informações clara e construtiva;
·        proporcionar orientação constante sobre o desempenho dos colaboradores buscando melhorias;
·        estabelecer um clima de confiança, cooperação, motivação e qualidade de vida entre os membros das equipas de trabalho;
·        auxiliar na avaliação final dos resultados alcançados.

Estudos recentes indicam que a avaliação de desempenho traz quatro benefícios principais: maior alinhamento entre metas pessoais e metas institucionais, melhoria no processo de supervisão, incremento da comunicação entre supervisores e colaboradores e uma maior abrangência do próprio processo de avaliação (Kersten & Israel, 2005 citados por Reifschneider, 2008).

2.2. Factores da avaliação de desempenho
Segundo o GGDF (2003), a avaliação de desempenho é realizada considerando-se factores de desempenho legitimados, cujos factores estabelecidos serão definidos como padrões de desempenho desejáveis e esperados de todos os colaboradores da organização, indistintamente. No quadro a seguir, são apresentados os factores da avaliação de desempenho e seus conceitos.

Factor
Conceito
Qualidade
Realizar o trabalho com planeamento e organização, de acordo com os padrões estabelecidos, aplicando o conhecimento técnico exigido e buscando sempre a eficiência na utilização dos recursos disponíveis e a satisfação do usuário do serviço prestado;
Dedicação e compromisso
Aplicar-se no desenvolvimento dos trabalhos com disponibilidade, responsabilidade, participação, aperfeiçoamento contínuo e visão global da organização, enfatizando o cumprimento das metas do trabalho e da missão institucional;
Relacionamento interpessoal
Lidar social e profissionalmente com pessoas, independentemente do nível hierárquico, influenciando-as construtivamente e demonstrando respeito à individualidade de cada um, tendo sempre como objectivo a melhoria do trabalho como um todo;
Iniciativa e criatividade
Tomar iniciativa e criar idéias inovadoras para o desenvolvimento dos trabalhos e da organização, na falta de normas e processos previamente determinados, demonstrando senso crítico e interesse pela pesquisa e produção de conhecimento;
Gestão de pessoas (exclusivo para  a avaliação de gestores)
Capacidade técnica e gerencial para administrar com efetividade os recursos humanos disponíveis de forma a garantir o melhor desenvolvimento dos processos de sua unidade de trabalho.


De acordo com Chiavenato (1981) citado por Ferreira & Lopes (2007), através da avaliação podem ser observadas competências como: visão estratégica, planeamento, organização, responsabilidade, acompanhamento, liderança, delegação, tomada de decisão, solução de problemas, proactividade, inovação, orientação a resultados, auto-desenvolvimento, administração de conflitos, capacidade de negociação, flexibilidade e adaptação à mudanças, competências interpessoais e trabalho em equipa.

3. Gestão de conflitos
O conflito pode ser definido como um processo que se inicia quando um indivíduo ou grupo de indivíduos se sente negativamente afectado por outra pessoa ou grupo de pessoas (De Dreu; 1997 citado por Pereira & Gomes, 2007). Na perspectiva de Pereira & Gomes (2007), conflito pode ser definido como um processo no qual o esforço é propositadamente feito por “A” para destruir o esforço de “B”, com recurso a qualquer forma de bloqueio que resulte na frustração de “B” no que concerne à prossecução das suas metas e ao desenvolvimento dos seus interesses.
Apesar de ser tão complexo definir conflito, como referem muitos autores, após a análise realizada do conceito acima, alguns aspectos ficaram bem claros: primeiro, pode-se destacar a questão da necessidade de no mínimo duas partes para que haja o conflito; segundo, a existência do conflito depende da percepção das partes da situação conflituosa; e terceiro, existem diversos tipos de conflitos, porém, na sua essência, estão relacionados ao posicionamento das partes de acordo com a situação apresentada, daí que os conflitos são, portanto, um fenómeno relacional.

3.1. Aspectos negativos e positivos de conflitos
A abordagem tradicional ao conflito refere que o conflito é algo negativo, assustador e a ser evitado.                                                      Segundo esta abordagem, todo conflito é danoso e deve ser evitado, é visto como contra-producente e é usado como sinónimo de palavras como violência, destruição e irracionalidade (Cavalcanti, 2006). Não obstante, a abordagem actual (abordagem interacionista) do conflito é exactamente oposta à primeira, pois assume o conflito como algo positivo e encára-o como um factor de mudança e um estimulador à criatividade e à inovação e, asssim sendo, é indispensável para o desempenho eficaz dos colaboradores na organização (Cavalcanti, 2006 & Gil, 2008).
Tanto uma como outra abordagem, segundo aponta Gil (2008), são aceitáveis e referem-se à aspectos positivos e negativos do conflito, porém actualmente, de acordo com os novos modelos de gestão e de liderança, dá-se relevância a abordagem interaccionista.

3.1.1. Aspectos negativos
·        Induz cada adversário a fazer atribuições hostis ao outro;
·        Provoca impasses e atrasos no processo decisório;
·        Provoca decréscimo nos níveis de satisfação;
·        Reduz o empenhamento organizacional;
·        Destrói a moral dos grupos e organizações;
·        Suscita comportamentos retaliatórios e irresponsáveis.

3.1.2. Aspectos positivos
  • Gera motivação e energia para executar melhor as tarefas;
  • Facilita a inovação, a mudança e a adaptação;
  • Torna o clima organizacional mais entusiasmante;
  • Reduz a preguiça social;
  • As pessoas aprendem através do confronto de ideias, o que pode melhorar a qualidade das decisões;
  • Permite libertar tensões.
4. Avaliação de desempenho e conflitos organizacionais
De acordo com Beer (1986) citado por Filder (1989) in GGDF (2003), a organização deseja que os colaboradores sejam receptivos à informações negativas para que possam melhorar seu desempenho, enquanto que os colaboradores desejam confirmar sua imagem positiva e obter recompensas. Nesse caso, é preciso estar atento à possibilidade de que, para obter uma boa avaliação, os colaboradores muitas vezes recorrem à auto-promoção, facto que reforça a necessidade de se estabelecerem critérios objectivos de avaliação (Milkovich & Boudreau, 2000 citados pelo GGDF, 2003).
Para o gestor, a avaliação tem duas instâncias: uma formativa, que visa à melhoria de processos de desempenho futuro e outra somatória, que visa à avaliação de desempenho passado, esse duplo propósito do processo de avaliação é fonte de controvérsia entre estudiosos (Redmon, 1999 citado por GGDF, 2003).
Entretanto, embora haja controvérsia entre vários autores sobre a perspectiva bi-dimensional (formativa e somatória) da avaliação de desempenho nas organizações, concorda-se que ambas instâncias fazem parte do processo de avaliação, na medida em que para se fazer uma avaliação cabal aos colaboradores é necessário combiná-las. A instância formativa serve de supervisão com vista a melhoria do processo, prevendo, deste modo, o desempenho futuro; enquanto que a instância somatória tem em conta o desempenho passado dos colaboradores, permitindo assim comparações do desempenho passado, presente e a antevisão do desempenho futuro.
O facto de a avaliação de desempenho influenciar recompensas (pagamento e reconhecimento), carreiras (promoção, demissão e reputação), assim como a auto-imagem do colaborador, impede que este colaborador esteja aberto ao diálogo franco necessário a sua avaliação e desenvolvimento pessoal (Beer, 1986 citado por Filder, 1989 in GGDF, 2003).

4.1. Como é que a avaliação de desempenho pode gerar conflitos nas organizações
Tendo-se em conta que o homem é um ser que possui necessidades, desejos e sentimentos que precisam ser considerados e analisados, essas necessidades e/ou sentimentos influenciam o comportamento e o desempenho dos colaboradores na organização. Daí que é preciso compreender que para o colaborador produzir o esperado e ter uma evolução profissional e, consequentemente no seu desempenho, precisa estar satisfeito com o trabalho realizado e com os objectivos, os valores, a cultura e o clima da organização.
Frequentemente, ao invés de uma avaliação de desempenho, o que certos gestores fazem é simplesmente um julgamento de valor sem base concreta, sem critérios definidos ou válidos, geralmente comunicado  ao colaborador de forma arbitrária e repentina. É exactamente essa atitude, decorrente da falta de preparação e entendimento do processo de avaliação por parte dos gestores e da falta de estrutura organizacional para avaliação e treinamento que leva à insatisfação dos colaboradores e consequentemente pode gerar conflitos (Reifschneider, 2008).

Um dos problemas básicos na avaliação de desempenho que pode suscitar conflitos é a importação de modelos de avaliação de uma organização para implementar noutra organização, o que raramente funciona de forma eficaz, pois o facto de uma prática funcionar bem num contexto não significa que funcionará da mesma forma noutro, para além de que a valiação de desempenho, normalmente, é feita em função da estrutura organizacional, o grau de complexidade da organização, a área de actuação dessa organização e os modelos de gestão em uso na organização (GGDF, 2003).

Outras razões são a falta de comprometimento por parte dos gestores; ausência de medidas que deem prosseguimento à processos como treinamento, tempo necessário para avaliação, restrições inerentes ao modelo de avaliação adoptado e padrões desiguais de avaliação entre avaliadores (Reifschneider, 2008); padrões esses que tendem a ser associados aos níveis de competência dos avaliadores (Bradshaw 1996 citado por Reifschneider, 2008). Outro importante motivo é a inadequação do processo de avaliação à cultura organizacional, à missão e à visão estratégica da organização (Fidler, 1989 citado por Reifschneider, 2008), que, em si, podem desestimular uma avaliação abrangente e honesta, levando a uma erosão do processo e eclosão de conflitos (Kersten & Israel, 2005 citados por Reifschneider, 2008).

4.2. Gestão de conflitos resultantes de avaliação de desempenho nas organizações
De modo a evitar ou diminuir conflitos resultantes da avaliação de desempenho nas organizações, como aponta Filder (1989) citado por GGDF (2003), uma série de medidas é recomendada:
·        separação entre avaliação formativa e somatória, adotando-se dois processos distintos separados no tempo por seis meses;
·        escolha de critérios apropriados de avaliação; descrição abrangente e precisa de funções; declaração objectiva e mensurável do desempenho esperado; e descrição clara das habilidades, conhecimento, atitudes e características pessoais esperadas;
·        reconhecimento das diferenças individuais no desenho de sistemas de avaliação, já que, por exemplo, colaboradores com uma condição física especial (mutilados e coxos) e e colaboradores novos podem precisar de avaliações mais frequentes;
·        avaliação de cima para baixo e de baixo para cima (vertical), isto é, para permitir que os colaboradores também avaliem o desempenho dos seus superiores hierárquicos, o que ajuda a quebrar as barreiras de relacionamento entre colaborador-gestor e vice-versa;
·        uso apropriado de um tipo de entrevista que leve o colaborador a reconhecer que deve melhorar seu desempenho ou que promova uma maior comunicação entre o gestor e colaborador e vice-versa e conduza à mudança de atitude de ambos.
Os gestores da organização podem ser encorajados a manter um nível mínimo e constante de conflito, permitindo que os colaboradores se mantenham autocríticos e criativos (Robbins, 2002 citado por Cavalcanti, 2006). O conflito resultante da avaliação de desempenho, em si, não pode ser considerado bom ou mau, pois  a sua natureza e a forma de gerí-lo é que farão com que suas consequências sejam positivas ou negativas para os colaboradores e para a organização como um todo (Likert & Likert, 1979; Umstot, 1984 & Baron, 1986 citados por Cavalcanti, 2006).

5. Tipos de gestão de conflitos
Os cinco tipos de gestão de conflitos podem ser caracterizados em termos dos seguintes
tipos de comportamento:
Evitação:

·         Ignora os conflitos esperando que assim desapareçam;
·         Coloca os problemas sob consideração ou em suspenso;
·         Recorre a métodos muito lentos para reprimir o conflito;
·         Usa sigilo para evitar confrontação;
·        Apela para regras burocráticas como uma fonte de resolução de conflitos
Negociação:

·        Discute;
·        Procura entendimentos e compromissos;
·        Encontra soluções satisfatórias ou aceitáveis.
Competição:

·        Cria situações claras de ganhar ou perder;
·        Utiliza a rivalidade;
·        Utiliza jogos de poder para chegar aos seus propósitos;
·        Força a submissão.
Acomodação:

·        Cede;
·        Submete-se e obedece.
Colaboração:

·        Quer resolver os problemas;
·        Confronta as diferenças compartilhando ideias e informações;
·        Busca soluções integradoras;
·        Encontra soluções nas quais todos ganham;
·        Vê problemas e conflitos como desafios.

Fonte: Adaptado de (Thomas, 1976 citado por  Cavalcanti, 2006).


6. Análise reflexiva
Os conflitos organizacionais tendem a ser maiores quando a avaliação indica que o colaborador tem um desempenho consistentemente abaixo do desejado; quando o colaborador não tem conhecimento sobre os ítens considerados na avaliação; quando há disparidade entre os objectivos da avaliação e os objectivos individuais; quando os colaboradores não concordam com os critérios e as modalidades usados no processo de avaliação; quando a avaliação não for válida e fidedigna. É preciso lembrar que um desempenho insatisfatório como resultado de um processo de avaliação, também pode ser devido a falhas da organização ou de gestão, ou ainda à influências externas e não só à deficiências dos colaboradores em causa.
De acordo com algumas entrevistas informais efectuadas, o facto de inevitavelmente um processo de avaliação indicar uma minoria com desempenho insatisfatório pode dever-se ao facto de muitos gestores preferirem manter boas relações em deterimento de avaliar cabalmente os colaboradores, para evitar conflitos, mas esta atitude é anti-ética e pode minar todo o processo de avaliação, o clima organizacional e, consequentemente, a produção e a produtividade da organização.
O gestor é responsável por fazer com que todos os subsistemas organizacionais trabalhem de forma integrada, e ele o faz, contribuindo para que os subsistemas individuais façam sua parte no todo. A estrutura, o pessoal, o estilo operacional, o sistema de recompensas e a liderança precisam  trabalhar nas suas respectivas responsabilidades de forma integrada para garantir a eficiência da organização.

É importante observar que gerir conflitos resultantes da avaliação de desempenho não significa extinguí-los definitivamente, gerir significa tirar proveito do conflito para optimizar o resultado. Contudo, não há uma fórmula para lidar com os conflitos e resolvê-los de forma correta. Assim, para lidar com o conflito derivado tanto da avaliação, como de outros causas é importante, primeiro, compreender a sua natureza, sua dinâmica e suas variáveis, pois somente com o diagnóstico da situação de conflito é que será possível enfrentá-lo adequadamente.

Para reduzir as consequências negativas dos conflitos derivados da avaliação de desempenho, dada a sua orientação competitiva é necessário que se descubram objectivos sobre os quais os colaboradores envolvidos estejam de acordo, para que assim restabeleçam a comunicação. Mas também, pode consistir na localização de um objectivo superior comum que possa permitir aos colaboradores envolvidos no conflito, ser responsabilizados a executar uma tarefa nova que exija cooperação entre eles.

Portanto, a avaliação de desempenho constitui um elemento basilar para o funcionamento eficaz de qualquer organização, na medida em que promove a manutenção e o melhoramento da produção e da produtividade; a manutenção dos níveis de satisfação dos colaboradores; a promoção dos colaboradores; e acima de tudo, a manutenção de um clima organizacional saudável a nível da organização.


7. Conclusão
As organizações são compostas por grupos de pessoas que interagem entre si, seja de um modo mais ténue ou de um modo mais vigoroso. Estes discutem devido a discordância de ideias e à diferentes interpretações das ocorrências ou valores opostos.
Sendo o gestor responsável por fazer com que todos os colaboradores e subsistemas organizacionais trabalhem de forma integrada, contribuindo para que os subsistemas individuais façam sua parte no todo, a estrutura, o pessoal, o estilo operacional, o sistema de recompensas e a liderança precisam  trabalhar nas suas respectivas responsabilidades de forma integrada para garantir a eficiência da organização.
Contudo, é importante observar que gerir conflitos resultantes da avaliação de desempenho não significa extinguí-los definitivamente, gerir significa tirar proveito do conflito para optimizar o resultado, de modo que não há uma fórmula para lidar com os conflitos e resolvê-los de forma correta. Assim, para lidar com o conflito derivado tanto da avaliação, como de qualquer outra origem é importante, primeiro, compreender a sua natureza, sua dinâmica e suas variáveis, pois somente com o diagnóstico da situação de conflito é que será possível enfrentá-los adequadamente.



8. Referências Bibliográficas

Cavalcanti, A. C. R. (2006). O Gestor e seu papel na gestão de conflitos: Um estudo de caso em empresa de varejo de vestuário masculino. Belo Horizonte:
 Faculdade de Ciências Econômicas

Ferreira, B. A. & Lopes, C. D. (2007). Avaliação de desempenho nas organizações: princípios e métodos fundamentais. Coimbra: Instituto Superior de Coimbra.

Gil, D. L. L. (2008). Negociação e Gestão de Conflitos: Gestão de Recursos Humanos. Coimbra: Instituto Politécnico de Enginharia de Coimbra.

Grupo de Gestão de Desempenho Funcional – GGDF. (2003). Manual de Avaliação de Desempenho. Recife.

Nascimento, R. F. L.; Lopes, R. M. F. & Argimon, I. L. (2005). Avaliação de Desempenho nas Organizações. Disponível em: www.psicologia.com.pt, acessado aos 06.05.2011, pelas 12:33min.

Pereira, J. M. F. & Gomes, B. M. F. (2007). Conflitos: Gestão de conflitos. Coimbra: Instituto Superior de Coimbra.

Reifschneider,  M. B. (2008). Considerações sobre avaliação de desempenho.  aval.pol.públ.Educ.vol.16, nº.58. Rio de Janeiro: Touro University International, Cypress, CA. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-40362008000100004, acessado aos 06.05.2011, pelas 12:27min.