Introdução
A maturidade de uma ciência se mede, em grande parte, por sua capacidade de expressar leis em linguagem matemática e de estabelecer mecanismos dedutivos. Assim, a aplicação dos testes psicométricos, iniciada nos finais do século XIX e inícios do século XX, contribuiu para que a Psicologia ascendesse à categoria de ciência. Desta feita, os primeiros estudos sistemáticos de medição psicológica datam do final do século XIX e se desenvolveram com base na matemática das probabilidades, sob influência de duas correntes: a primeira delas, que deu origem à psicofísica, constituiu uma tentativa de aplicação dos métodos das ciências físicas à mente humana. A segunda, que levou à criação dos testes psicológicos, visava à criação de métodos de medição da estabilidade emocional e da inteligência.
Psicometria é a área da psicologia que trata do desenvolvimento e da aplicação de técnicas de medição aos fenômenos psíquicos (psicológicos). Em Psicometria, as medições se fazem mediante a atribuição de valores numéricos aos comportamentos, de maneira que as diferenças de comportamento sejam representadas por variações nesses valores numéricos.
O presente trabalho elaborado no âmbito da cadeira de Testes Psicotécnicos, versa sobre “a Psicometria, sua origem, momentos-chave do seu aparecimento e os seus principais percursores” e, por sua vez, será estruturado, para além da introdução, nos seguintes termos: aparecimento da Psicometria, momentos-chave do aparecimento da Psicometria, os métodos ligados à Psicometria, os grandes percursores e o contributo que deram a Psicometria e a conclusão que culminará com as considerações finais.
Origem da Psicometria
Com base com a divisão tradicional da psicologia, «alma vs corpo», referenciam-se duas tendências. De um lado temos a psicologia alemã da introspecção, que estava interessada na experiência subjectiva e do outro lado, o empirismo inglês e norte-americano interessado no comportamento, bem como a escola (psicofísica) de Leipzig, que estudava os processos sensoriais. De entre estas duas grandes orientações, uma (a psicologia introspectiva) caracterizava-se pelo uso de procedimentos meramente descritivos, enquanto que a outra (a psicologia de orientação empirista) se preocupava com procedimentos quantitativos (Pasquali, 2003).
Psicometria é a área da psicologia que trata do desenvolvimento e da aplicação de técnicas de medição aos fenômenos psíquicos - psicológicos (Pasquali, 2003).
De acordo com Pasquali (2003) a Psicometria (mais precisamente os testes psicológicos) poderia ter tido origem numa das duas situações bastante distintas acima referidas: a psicologia de orientação empirista ou a psicologia mentalista de Binet, na França. Desta feita, Binet e Simon (1905) utilizavam processos mentais enquanto que Galton (1883), Spearman (1904b) e outros empiristas faziam uso de processos comportamentais, mais precisamente, sensoriais. Contudo, embora os testes de inteligência de Binet tenham tido muito sucesso na Psicologia, não foi da sua orientação que se deu origem a Psicometria, ela teve origem no enfoque empirista da psicologia da época.
Métodos ligados à Psicometria
A psicometria, tanto clássica quanto moderna, possui algumas caracterizações que entre elas permitem controvérsias. Enquanto por um lado, a Psicometria, pelo menos na sua prática, é ainda guiada pela concepção positivista baconista do empirismo, segundo a qual, a ciência do universal se faz através do conhecimento do singular – indução - , enfoque demonstrado como logicamente inviável, tanto pelo empirista Hume (1739-1740) quanto pelo Popper (1972). Por outro lado, em Psicometria predomina a concepção estatística (método estatístico) sobre a psicologia, pois os percursores que desenvolveram a Psicometria eram estatísticos de formação, tanto é que ainda se define a psicometria como um ramo da Estatística, quando na verdade ela deve ser concebida como um ramo da Psicologia que interfaceia com a Estatística (Pasquali, 2003). Assim sendo, segundo este autor, a origem da Psicometria deve ser procurada nos trabalhos do estatístico Spearman (1904ª, 1904b, 1907 e 1913) e, no que se refere à Psicologia, ela seguiu os procedimentos fisicalistas de Galton (1883).
Os grandes percursores e o contributo que deram a Psicometria
Os primeiros psicólogos cientistas foram, aliás, tanto ou mais físicos e fisiólogos do que psicólogos. Sabe-se que o primeiro laboratório de psicologia experimental foi criado em 1879 por Wundt, na Leipzig - Alemanha. Foi ali, pode dizer-se, que nasceu ou pelo menos foi concebido o método dos testes. Os primeiros trabalhos de laboratório limitavam-se no entanto ao estudo dos processos inferiores: domínio sensorial e motor. Só mais tarde se empreendeu o estudo experimental do pensamento e da vontade. Entretanto, numerosos discípulos de Wundt expandiram as concepções e técnicas do laboratório que ele tinha estudado e colocaram-nas ao serviço da vida real. Encontramo-las em todos os países da Europa e da América, a Alemanha foi um viveiro da psicologia aplicada (Urbina, 2007).
Francis Galton (1822-1911)
A contribuição mais directa que convém pôr em relevo por não ter nascido entre as paredes de um laboratório, mas por partir do interesse que têm em si as diferenças individuais é a obra de Francis Galton, contemporânea de Wundt e seus alunos. Primo de Darwin e seu discípulo, Galton foi essencialmente um biólogo, mas as suas investigações orientaram-no para a medida de aptidões individuais. Foram as investigações sobre a hereditariedade que o levaram a medir os caracteres que distinguiam mais ou menos os parentes ou não parentes (Urbina, 2007).
A Década de Galton (1880): para Francis Galton (biólogo inglês) à avaliação das aptidões humanas se dava por meio da medida sensorial, através da capacidade de discriminação do tacto e dos sons. Galton entendia que, a “única informação que nos atinge, vinda dos acontecimentos externos, passa, aparentemente pelo caminho de nossos sentidos. Quanto maior o discernimento que os sentidos tenham de diferentes, maior o campo em que podem agir no nosso julgamento de inteligência” (Pasquali, 2003).
A contribuição de Galton para a psicometria, de acordo com Pasquali (2003),ocorreu em três áreas:
· criação de testes antropométricos para medida de discriminação sensorial (barras para medir a percepção de comprimento);
· apito para percepção de altura do tom;
· criação de escalas de atitudes (escala de pontos, questionários e associação livre);
· desenvolvimento e simplificação de métodos estatísticos (método da análise quantitativa dos dados coletados).
A Década de Cattell (1890): influenciado por Galton, James M. Cattell (psicólogo americano) desenvolveu medidas das diferenças individuais, o que resultou na criação da terminologia Mental Test (teste mental). Elaborou em Leipzig sua tese sobre diferenças no tempo de reacção. Este consiste em registar os minutos decorridos entre a apresentação de um estímulo ou ordem para começar a tarefa, e a primeira resposta emitida pelo examinando. Cattell seguiu as idéias de Galton, dando ênfase às medidas sensoriais, porque elas permitiam uma maior precisão (Pasquali, 2003).
A Década de Binet (1900): seus interesses estavam virados para avaliação das aptidões mais nas áreas acadêmica e da saúde. Alfred Binet e Henri fizeram uma série de críticas aos testes até então utilizadas, afirmando que eram medidas exclusivamente sensoriais que, embora permitisse maior precisão, não tinham relação importante com as funções intelectuais. Seu conteúdo intelectual fazia somente referências às habilidades muito específicas de memorizar, calcular, quando deveriam se ater às funções mais amplas como memória, imaginação, compreensão, etc. Em 1905, Binet e Simon desenvolveram o primeiro teste com 30 itens (dispostos em ordem crescente de dificuldade) com o objectivo de avaliar as mais variadas funções como julgamento, compreensão e raciocínio, para detectar o nível de inteligência ou retardo mental de adultos e crianças das escolas de Paris. Estes testes de conteúdo cognitivo atendiam a funções mais amplas, e foram bem aceites, principalmente nos EUA, a partir da sua tradução por Terman (1916), nascendo, assim, a era dos testes com base no Q.I. (Pasquali, 2003).
Q.I. = 100 (IM/IC)
Onde:
Q.I. = quociente intelectual/inteligência
IM = idade mental
IC = idade cronológica
A Década da Análise Fatorial (1930): por volta de 1920, segundo Pasquali (2003), diminuiu o entusiasmo pelos testes de inteligência, sobretudo por se demonstrar dependentes da cultura onde foram criados, o que contrariava a idéia de fator geral universal de Spearman. Kelley quebrou a tradição de Spearman em 1928, e foi seguido, na Inglaterra, por Thomson (1939) e Burt (1941), e nos EUA, por Thurstone. Este autor é relevante para época, em vista de que, além de desenvolver a análise fatorial múltipla, actuou no desenvolvimento da escala psicológica (Thurstone e Chave, 1929), tendo fundando, em 1936, a Sociedade Psicométrica Americana e a revista Psychometrika (Pasquali, 2003).
A Era da Sistematização (1940-1980): esta época é marcada por duas tendências opostas: os trabalhos de síntese e os de crítica. Em 1954, Guilford reedita Psychometric Methods e tenta sistematizar a teoria clássica, e Torgerson (1958) a teoria sobre a medida escolar. Além disso, Cattell e Warburton (1967) procuraram sintetizar os dados de medida em personalidade, e Guilford (1967) a teoria sobre a inteligência. Entre os trabalhos da crítica, destaca-se Stevens (1946), que levantou o problema das escalas de medida (Pasquali,2003). Por outro lado, este autor refere que divulgou-se também a primeira crítica à teoria clássica dos testes na obra de Lord e Novick (1968, Statistical Theory of Mental Tests Scores), que iniciou o desenvolvimento de uma teoria alternativa, a do traço latente, que se junta à teoria moderna de Psicometria, e a Teoria de Resposta ao Item - TRI. Outra tendência crítica para superar as dificuldades da Psicometria clássica foi iniciada pela Psicologia Cognitiva de Sternberg e Detterman (1979), Sternberg e Weil (1980), com seu modelo, procedimentos e pesquisas sobre os componentes cognitivos, na área da inteligência.
A Era da Psicometria Moderna - Teoria de Resposta ao Item – TRI (1980): talvez chamar a era atual de TRI seja inadequada, conforme Pasquali (2003), porque:
a) esta teoria embora seja o modelo no Primeiro Mundo, ainda não resolveu todos seus problemas fundamentais para se tornar um modelo definitivo de psicometria e,
b) ela não veio para substituir toda a psicometria clássica, mas, apenas partes dela, no entanto, é o que há de mais novo nesse campo.
Conclusão
Em trabalhos acadêmico-científicos é difícil dar cumprimrnto cabal ao prtendido, porém mais difícil ainda é fazer um trabalho que satisfaça, em termos científicos, as espectativas de quem o possa posteriormente ler com o intuito de dele assimilar algo ou julgar. A realização deste trabalho, cujo tema versa sobre a psicometria, sua história e seus percursores permitiu com que se aprofundasse os aspectos ralativos à testes psicológicos e abriu caminhos cognitivos rumo à mais uma aprendizagem. Ora, partindo do princípio que a Psicometria é uma área da Psicologia que trata do desenvolvimento e da aplicação de técnicas de medição aos fenômenos psicológicos, fica claro, de forma conclusiva, que o seu aparecimento no campo da Psicologia, constituiu um marco importantante e imprescindível para a afirmação da Psicologia como ciência com objecto e métodos (métodos quantitativos) próprios, a semelhança de qualquer outra ciência, particularmente das ciências naturais.
Referências Bibliográficas
Pasquali, L. (2003). Psicometria: Teorias dos testes na Psicologia e na Educação. Vozes: RJ, 2ªed.
Urbina, S. (2007). Fundamentos da Testagem Psicológica. Artmed: Porto Alegre.